RUA JORGE LACERDA (RUA DO SAPO), EM 1940 (DATA
APROXIMADA). A flecha e o círculo mostram o local exato da briga, que aconteceu
dezoito anos depois que esta fotografia foi clicada, entre dois exércitos de
paus-d’água. Naquele tempo (1958), eu tinha oito anos de idade; duas valetas,
uma de cada lado da rua, escoavam as águas vindas dos morros que ladeavam a rua
pelos dois lados. Acontece que as valetas e os poucos bueiros existentes ao
longo da via não eram suficientes para dar vazão às enxurradas das chuvas que
desciam dos morros e que já mostramos em outras reportagens passadas, por isso
as enchentes eram comuns. Dava até para andar de canoa e nadar em plena via.
Este problema persiste ainda hoje e não vai ser resolvido tão facilmente! Foi
nesta mesma rua, numa tarde cinzenta de domingo, que presenciei uma espetacular
briga de dois grupos embriagados que partiram de dois bares diferentes e distantes
um do outro e se encontraram, em pleno combate, no meio do caminho. Um era o
bar do Boelitz, cito em frente à Oficina Mecânica Rio Negrinho na esquina com a
Rua do Sapo; o outro, a 500 metros dali, era o bar de Walfrido Carvalho, cito
na Rua do Sapo. No bar do Carvalho, uns quinze elementos pinguços, depois de
“encher a cara de cachaça”, resolveram “tirar a limpo” todas as dúvidas que
queimavam seus neurônios, se é que ainda os tinham. E a solução para aliviar a
“carga psicológica” foi “sair no braço”. Nove guerreiros de um lado e seis de
outro iniciaram uma peleja de fazer inveja à Guerra do Iraque. Depois de
quebrarem os móveis dentro do bar, e por falta de espaço para dar umas voadeiras,
pois o bar era pequeno até para dar um bom soco, pois se alguém esticasse o
braço demais para trás, a fim de pegar impulso para dar maior força ao sopapo
naquele que estava na frente, podia até acertar num amigo da retaguarda que
dava-lhe cobertura, resolveram, então, rolar para o meio da rua, mas para isso
tiveram que atravessar uma pinguela que ligava a rua ao bar. Havia chovido e o
estreito tablado estava liso, uns dois ou três perderam o equilíbrio,
abandonaram a tropa e foram beijar o fundo da valeta. Na rua sim, tinha até
pedras que serviam como “soco inglês”. Em certo momento vi um dos “atletas”
correndo morro acima gritando que ia buscar uma espingarda, só que não mais foi
visto durante o pugilato. Acho que ele bateu em “retirada estratégica”! E este
pertencia ao grupo menor que agora ficou com apenas cinco defensores contra
nove. Então o grupo menor foi cedendo espaço ao grupo maior que ganhava terreno,
coice por coice. Pancada prá cá, pancada prá lá e lá foi aquele bolo de gente
rolando em direção ao antigo Cartório do Jablonski, na direção do bar do
Boelitz. Teve “cabra” que esgotou sua lista de palavrões umas dez vezes.
Lembro-me bem, alguns gritavam mais que cego em tiroteio. Lindo de ver era a
torcida por trás das cercas de ripas de madeira que cercavam as casas. Nesse
mesmo tempo, no bar do Boelitz, outro grupo, também uns quinze malucos com o
“sangue cozido”, resolveu “acertar os ponteiros” e extravasar o estresse. A
cena foi idêntica ao bar do Carvalho: móveis quebrados e o lugar também era
pequeno para tantos “guerreiros” por isso resolveram ocupar a rua para
continuar o embate. Às pedradas, socos e pontapés, foram avançando em direção
aos heróicos lutadores do bar do Carvalho que, ao mesmo tempo, também ganhavam
terreno em direção ao bar do Boelitz. Alguns do bar do Carvalho abandonaram a
luta e fugiram em direção ao bar do Boelitz, mas tiveram que voltar porque do
outro lado um paredão de aguerridos ainda mais furiosos e violentos vinha em
sua direção. Não havia como escapar! Mais ou menos em frente à Torrefação de Café,
cita onde hoje é o Mercado Neidert, no meio do caminho, os dois grandes grupos
se encontraram. Aí foi um “Deus nos acuda”. A Segunda Grande Guerra Mundial foi
fichinha perto da Guerra da Rua do Sapo! Eram uns trinta valentões misturados em
plena atividade discordante. Ninguém mais sabia quem era quem! Amigos se
tornaram inimigos e vice-versa. O jeito era bater em quem estava mais perto.
Alguém teve a “feliz” idéia de arrancar uma ripa de cerca para atacar e se
defender. Quase todos fizeram o mesmo! Os “espadachins e samurais” distribuíam
cacetadas prá todo lado, mesmo porque naquele momento ninguém mais sabia quem
era amigo ou inimigo. “Vapt”, “vupt”, “flapt” e muitos outros sons aterradores
eram o barulho das ripas nas costas e nas cabeças. Pior eram os carecas que não
tinham nenhuma mecha para amaciar a cacetada no próprio “telhado”. Alguns mais
arrojados caíam nas valetas e quando conseguiam sair de lá cuspindo barro
levavam outra bordoada e voltavam para a valeta. Algumas ripas tinham pregos
que machucavam feio! Dentro das casas, por trás das cortinas, a mulherada apavorada
apreciava a “Guerra da Rua do Sapo”. No entanto, algumas davam risada. Cena
engraçada foi a de um baixinho que, se
viu “amarelo” quando levou umas cinco ripadas dos grandões, correu para dentro
de uma casa que estava com a porta aberta. Não deu prá contar até três, saiu de
lá voando depois de ter levado uma rodada de vassouradas de uma senhora que,
apavorada e furiosa, tentava defender seu território. E todo mundo sabe que
mulher com medo vira bicho perigoso! O baixinho voltou para o campo de batalha
porque lá era mais confortável. Uma delas, ao reconhecer seu marido no meio da
luta, saltou para fora da casa com uma vassoura na mão, embrenhou-se no meio
dos brutamontes para defender o amado. Só sei dizer que ela era a que mais gritava
e a que mais apanhava! E olha que o rosário de “santas palavras” da “Anita
Garibaldi” não era dos menores! Homens bêbados e de “sangue quente” não
diferenciam se o que está na sua frente é homem ou mulher, amigo ou inimigo – “sai
que lá vai cacetada!” Não lembro o que aconteceu com a heroína, mas lembro como
foi o final da briga. Alguém gritou: - “Lá vem a polícia”!... e em poucos
segundos não havia mais ninguém na rua, salvo alguns retardatários que tentavam
sair das trincheiras (valetas) cobertos de barro. Estes foram levados de braços
dado com dois soldados para a delegacia e, provavelmente, pagaram a conta de
todo mundo na cadeia, que naquele tempo era onde hoje está a Praça do Avião. Os
outros conseguiram fugir porque naquele tempo a polícia perseguia os bandidos
de bicicleta! Uma música gaucha diz assim: “...No lugar daquela briga nunca mais nasceu capim...” E eu completo
rimando: “...E na Rua do Sapo acho que
também foi assim!” Sabe que, no final das contas, Rio Negrinho antigo era
bem animado, prá não dizer turbulento! A Rua do Sapo era uma festa! Noutro dia
conto mais algumas!
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