Nota do Blog: Recebi por email do senhor Wilson Sichmann, morador da cidade de Camboriú o texto abaixo reproduzido, que retrata a vida de um professor por excelência.
28/07/2013: Parabéns
pelo seu blog sobre Rio Negrinho antigo, que só agora descobri. Anexo o
trabalho "Eventos na vida de Artur Sichmann", meu pai, professor e
diretor por vários anos no Grupo Escolar Profa. Marta Tavares, onde também fiz
o curso primário. Ele desenvolveu um ótimo trabalho na comunidade, que os
alunos mais antigos ainda recordam (Florinda Lampe, por ex., que até lhe mandou
um cartão de aniversário na época). Muitos dos industriais de móveis de Rio
Negrinho e São Bento foram seus alunos. Foi grande amigo de Carlos Zipperer,
fundador dos Móveis Cimo.Um dos seus grandes colegas foi o Prof. Elias
Graboski, de saudosa memória. Faleceu no ano de 2000 aqui em Camboriu, com
a idade de 99 anos. Tenho diversas fotos de suas atividades com os alunos,
desfiles patrióticos, horta escolar etc. que poderia disponibilizar para
cópia no seu blog e uso no Museu Histórico de Rio Negrinho. Atenciosamente,
Wilson Sichmann - 79 anos
Artur
Sichmann (*) nasceu em 7 de maio de 1903, na localidade
de Rio Branco, então distrito de Bananal, município de Joinville. Atualmente pertence
ao município de Guaramirim, Estado de Santa Catarina. Era filho de André
Sichmann e Amalia Jerulis Sichmann, imigrantes da Letônia que chegaram ao
Brasil em 1900 provenientes de Novgorod, na Rússia. Em 1921 foi estudar no
Colégio Batista do Rio de Janeiro, sob inspeção federal do Colégio D.Pedro II.
Trabalhando e sustentando-se por conta própria, graduou-se, com distinção,
Bacharel em Ciências e Letras em 1929. Já formado, serviu ao Exército
Brasileiro no 1° Batalhão de Artilharia Montada do Rio de Janeiro. Dedicou-se à
alfabetização de novos recrutas e aos esportes. Em 7/09/1931, competindo com
mais de 800 concorrentes, classificou-se em 3° lugar na corrida de cem metros
rasos promovida pelo exército. Declinou do convite para seguir a carreira
militar, desligando-se do exército em 1931. Seu trabalho foi elogiado pelo
comandante coronel José Meira de Vasconcellos e registrado em sua carteira
militar. Retornou a Santa Catarina, casando-se com Laura Maria Gomes em 22/09/1931.
Em Joinville, inscreveu-se e prestou concurso para o magistério estadual em
1932. Aprovado e classificado em 1° lugar, escolheu a Escola de Bananal. Não
chegou a tomar posse ali. Aceitou o convite do inspetor escolar Germano
Wagenführ e o desafio de trabalhar entre os imigrantes menonitas em Witmarsum,
localidade do então município de Dalbergia (Ibirama) e hoje município de
Witmarsum. Seu trabalho era reorganizar, a pedido dos próprios menonitas, suas
escolas particulares, assumindo-as e colocando-as no padrão das escolas
públicas estaduais.
(*)
Inicialmente registrado como Arthur Sichmann, com a reforma ortográfica da
língua portuguesa adotada no Brasil, teve mais tarde seu nome mudado em
cartório, a seu pedido, para Artur Sichmann. Como professor, queria estar de
acordo com a nova legislação ortográfica brasileira.
Em
14 de agosto de 1934, a pedido das colônias menonitas, foi designado para
organizar as escolas das localidades de Waldheim e Gnadental, bem como preparar
os professores estrangeiros para o exame exigido em Lei, incluindo o estudo da língua
nacional. Ali permaneceu até janeiro de 1937 no desempenho de suas tarefas,
procurando desenvolver o sentimento de amor à Pátria brasileira, inclusive na
realização de festividades em homenagem ao "Dia da Pátria". Em
Gnadental estudou, aprendeu e lecionou o método Braille para cegos, no objetivo
de integrar na educação formal um menino cego da comunidade, Franz Heinrichs. A
partir daí manteve intercâmbio com várias entidades e pessoas sobre o ensino do
método Braille para cegos. Seu trabalho foi objeto de elogio em ofício do Diretor
do Departamento de Educação, em Florianópolis. Obteve também o reconhecimento
dos alunos e da comunidade.
Itapocuzinho
Em 12 de janeiro de 1937 foi removido, a pedido, para a Escola Mixta da Estrada Itapocuzinho, entre Jaraguá e Bananal, à vista da classificação obtida em concurso de remoção. Além das atividades escolares, procurava realizar excursões com os alunos, para ampliar seus horizontes de conhecimento e cidadania. Está registrada uma excursão de alunos a Barra Velha, com objetivos didáticos, devidamente autorizada pelo Inspetor Escolar. Dedicou-se com êxito na recuperação de alunos que não conseguiam acompanhar as aulas normalmente ou cujo comportamento fugisse aos rígidos padrões exigidos na época. A exemplo do que fazia nas escolas por onde passou, continuou transmitindo aos alunos o sentimento de responsabilidade, patriotismo e amor à Pátria. Na Semana da Pátria, os alunos faziam encenação da Independência do Brasil, onde vários deles representavam os papéis principais.
Em 26 de janeiro de 1940 foi removido, a pedido, para a “Escola Mixta de Bananal” (Guaramirim). Em 1 de junho de 1940 é designado auxiliar de inspeção e participa dos trabalhos de orientação na construção do Grupo Escolar "Almirante Tamandaré". Em 4 de fevereiro de 1941 é removido para o mesmo Grupo. Em 5 de maio do mesmo ano é designado pelo Interventor Nereu Ramos para regência de classe , iniciando também um programa de horta escolar, em conjunto com o professor Urbano Teixeira. O trabalho executado foi objeto de elogio pessoal do Interventor Nereu Ramos e portaria n° 170, de 12 de janeiro de 1942.
Rio Negrinho
Pelo
Decreto n° 1265 de 24 de janeiro de 1942 foi removido, a pedido, para o Grupo
Escolar "Profª Marta Tavares", em Rio Negrinho, então distrito de Serra
Alta (São Bento do Sul), sob a direção do Professor Djalma Bento. Iniciou suas
atividades dando aulas para o 4° ano primário e continuou seu trabalho na recuperação
de alunos com maiores dificuldades de aprendizado. Transformou um terreno baldio
atrás do Grupo em horta escolar, ensinando os alunos a plantarem hortaliças que
eram a seguir incorporadas à merenda escolar.
Sua esposa, Laura Gomes Sichmann foi também admitida como professora em
1942, lecionando ali até 1952. Seu trabalho foi objeto de elogio registrado
pelo Diretor do Departamento de Educação, Professor Elpídio Barbosa. O Brasil
entra na Segunda Guerra Mundial e muitas pessoas com sobrenome de origem
estrangeira passam por problemas e investigações. Findo o conflito, a 28 de
novembro de 1945, Artur requer e obtém certidão de bom desempenho de seu
trabalho no magistério estadual. Em
31/12/45 assume a função gratificada de Diretor e Auxiliar de Inspeção. Após
prestar concurso público é aprovado e nomeado Diretor do Grupo Escolar
"Profª Marta Tavares" em 10/01/1949. Foi o primeiro concurso público
instituído para a carreira de Diretor no Estado de Santa Catarina, pela Lei 234
de 10/12/1948.
Após várias promoções, foi nomeado diretor
efetivo classe "K" em 2 de dezembro de 1949. Continuou a horta escolar. Iniciou e
desenvolveu uma pequena criação de abelhas européias para produção de mel em um
local afastado da horta, ensinando as crianças e adultos como fazê-la com segurança.
Com a colaboração de Martin Zipperer, proprietário da fábrica de móveis CIMO e
incentivador do desenvolvimento escolar fornecendo os materiais, equipou o
Grupo com praça de esportes para ginástica em várias modalidades. Realizava
ainda excursões escolares com as diferentes classes, uma forma de ensino prático
de ciências naturais, despertando a compreensão dos alunos para horizontes mais
amplos. Manteve sempre ativa a chama do patriotismo através dos eventos na Semana
da Pátria, Dia da Bandeira, desfiles com os alunos pela cidade de Rio Negrinho
e solenidades cívicas semanais. Em 18 de março de 1952 entrega o Inventário de
Bens do Grupo Escolar para seu sucessor, Professor Walmor Rosa, deixando Rio
Negrinho com destino a Araranguá.
Em 21 de março de 1952 é designado para responder pelo expediente da Inspetoria Escolar de Araranguá. Concursado e aprovado, é nomeado Inspetor Escolar classe "O" em 22 de setembro de 1952. Iniciando a carreira como Inspetor Escolar, visitou grupos e escolas isoladas nos municípios de Araranguá e Sombrio, viajando de ônibus, de bicicleta e a pé. Sua esposa Laura atuava como secretária e auxiliar de escritório.
São Joaquim
A
nomeação para o cargo de Inspetor implicou em remoção para São Joaquim, ainda em
1952. As escolas isoladas eram, em sua maioria, muito distantes e de difícil
acesso, sem estradas, existindo apenas trilhas por onde se andava a cavalo.
Artur, embora com habilidade em hipismo adquirida no Exército, não gostava de
andar a cavalo. Preferia visitar as escolas de bicicleta, em viagens que duravam
a semana inteira, mesmo nos meses de rigoroso inverno. Muitas delas nunca
tinham sido visitadas antes. Para documentar tais visitas, tirava fotografias
das escolas com professores e alunos. Depois
as enviava em relatórios periódicos a Florianópolis. Possuía uma pequena
motocicleta marca Dürkopp, ano 1939, que pouco auxiliava naquelas estradas. Em
1 de dezembro de 1953 foi promovido a inspetor classe "P". Em 30 de
janeiro de 1954, foi transferido, a pedido, para Ituporanga e dali para Camboriú.
Camboriú
Ainda
em 1954 assumiu o cargo de inspetor escolar efetivo na recém criada 47ª
Circunscrição Escolar, com sede em Camboriú e que abrangia desde Balneário
Camboriú até Porto Belo. Iniciou suas atividades em uma pequena casa de madeira
cedida pelo proprietário Luiz Vieira, na hoje Avenida Central de Balneário
Camboriú. Sua esposa Laura foi admitida como professora em 12 de julho de 1954
e exerceu suas atividades nas Escolas Reunidas Professor Laureano Pacheco, de
Canto da Praia. Mais tarde transferiu-se para a sede do município de Camboriú,
à Rua Siqueira Campos, em frente ao Cemitério Municipal. Em 1960 mudou para
outra casa, no prolongamento da mesma rua, hoje Siqueira Campos, 404 .
Atualmente as duas casas não mais existem. Nas estradas precárias e arenosas do
litoral, deslocava-se de bicicleta. Mais adiante adquiriu uma motocicleta maior
e ao final de seu trabalho viajava em um jipe financiado aos inspetores
escolares pelo Governo Estadual de Santa Catarina. Em cada escola visitada
procurava ver as dificuldades encontradas pelo professor, as necessidades da
escola e o aproveitamento dos alunos. Fazia os alunos sentirem-se à vontade,
contando histórias engraçadas e interessantes. Terminava ministrando uma aula
aos alunos. Continuava a documentar as visitas e a enviar relatórios
fotográficos aos superiores em Florianópolis.
Na qualidade de maior autoridade escolar da região e representante da Secretaria
da Educação, participava de todos os eventos e festividades principais nos
municípios sob sua jurisdição. Todo o material didático e administrativo
destinado para as escolas passava por sua mão. Os programas de assistência
social e da “Aliança para o Progresso”, vindos como doação dos Estados Unidos
também eram por ele administrados. Em um período de grande turbulência
política, procurou colocar o magistério e os interesses da educação acima de
pendências partidárias e religiosas. Suas prestações de contas foram todas
aprovadas pelo Tribunal de Contas do Estado. Aposentou-se em 28 de janeiro de
1964.
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Aposentado, mudou-se para Campinas, Estado de São Paulo, mantendo porém, residência em Camboriú, aonde vinha com frequência. Retornou definitivamente a Camboriú em 1991. Com a reforma administrativa havida no Estado e a extinção do cargo de Inspetor Escolar, seu nome e posto foram esquecidos, passando a perceber vencimentos ínfimos. Com a ajuda de professores, conseguiu restabelecê-los parcialmente. Em 1997 submeteu novamente o assunto à administração competente. Não viveu para alcançar o restabelecimento total. Faleceu em 4 de novembro de 2000, aos 98 anos de idade. Não viveu para alcançar o restabelecimento total. O professor João Calixto Faquetti perguntou-lhe, em entrevista há alguns anos, qual a profissão que desejaria seguir, se fosse possível voltar atrás: “Voltaria a ser professor, sem dúvida, foi a resposta. É a melhor profissão do mundo”.